EFEITOS RÁPIDOS EM PSICANÁLISE




Elza Mendonça de Macedo

Um tema de atualidade na psicanálise de orientação lacaniana, os efeitos terapêuticos rápidos mereceram, conversação clínica, livro, boletins e revistas de psicanálise, em vários países, com destaque na revista La Cause freudienne, nº 61, novembro de 2005, ressaltando o seu emprego nas clínicas sociais. No Brasil, as clínicas sociais, cuja prática buscaria, hoje, efeitos rápidos, onde ontem era o menor custo, são bastante conhecidas há muito tempo e em várias cidades. Na literatura, os mais diferentes efeitos terapêuticos rápidos começam a serem evidenciados em relatos de casos clínicos. Alguns deles foram discutidos na Clínica-Escola do IPLA. – “Como manter o seu efeito?” Eis a nova questão, destacada por Forbes.

Embora as clínicas sociais tenham tradição no Brasil, hoje o interesse renovado pelo tema é uma resposta à reivindicação por efeitos rápidos desse homem apressado do mundo globalizado, defendem alguns. As terapias cognitivo-comportamentais (TCC) ganham espaço oferecendo eliminação de sintomas em curto espaço de tempo. Elas têm recebido, inclusive, reconhecimento do Estado. A psicanálise que, devido aos pós-freudianos, se mantinha fechada nos consultórios, encapsulada em suas regras de quatro sessões por semana, sessões de 50 minutos ..., já rompe com essa tradição em 1951, graças a Lacan. Retornando a Freud e indo além, ele oferece ao mundo uma psicanálise que responde às demandas atuais, influenciando, inclusive, outras abordagens psicanalíticas. No mundo contemporâneo a psicanálise não se limita ao consultório. Ela se faz presente e eficaz nas instituições hospitalares, escolares, empresariais, artísticas, etc.

A Escola da Causa Freudiana leva a psicanálise à cidade, oferecendo tratamento gratuito, cria o Centro Psicanalítico de Consulta e Tratamento (CPCT). Na França, com o relatório do INSERM e com a emenda Accoyer defendendo as TCC, surgiram os Fóruns Psy, um movimento anti-TCC, liderado por Jacques-Alain Miller. Uma decorrência disso foi o interesse e divulgação dos efeitos terapêuticos rápidos, uma dimensão própria da experiência lacaniana. É da política lacaniana. Se Freud alertava que os analisantes não tomassem decisões importantes durante o tratamento é porque ele reconhecia seus efeitos rápidos e que a pessoa poderia vir a se arrepender de alguma decisão. O caso Katharina, de Freud (1893) é o primeiro exemplo de efeito rápido em psicanálise.

Centro Psicanalítico de Consulta e Tratamento
Os efeitos terapêuticos rápidos dizem respeito à psicanálise aplicada. Eles podem incidir tanto no sujeito como na instituição, cuja demanda ao analista é de efeito terapêutico rápido. Os Centros Psicanalíticos de Consulta e Tratamento (CPCT), um gênero de clínica social, que atendem em período de tempo mais ou menos limitado, são estruturados com base no tempo do encontro do sujeito com o que o causa. Estes Centros têm verificado efeitos terapêuticos rápidos.

Análises cíclicas
Um tema que se relaciona aos efeitos terapêuticos rápidos e aos CPCT é o das análises cíclicas, em que pontos de capiton fecham um ciclo da análise e funcionam como efeitos terapêuticos ao darem ao sujeito um novo ponto de referência. Geralmente a pessoa interrompe o tratamento e retorna num outro momento, com outra questão e percorre outro ciclo. Isto tem uma lógica que envolve o tempo do encontro do sujeito com a causa. A cada ciclo o mesmo encontro se repete, mas é uma repetição do novo, de uma nova forma. No CPCT pode ser formulado o primeiro ciclo desse encontro. Não se trata de fatias do tratamento, mas de ciclos que indicam que a análise é finita e que pode terminar várias vezes. Os efeitos terapêuticos rápidos seriam como uma análise em redução.

Apresentação de paciente
Os efeitos terapêuticos rápidos também se fazem sentir em apresentação de paciente. É um momento privilegiado em que um analista pode fisgar o real com a palavra dando ao sujeito uma possibilidade de rede de segurança. O caso da apresentação de paciente realizada por Forbes, [em] 18 de novembro O homem que come fezes. O paciente atribui seu sofrimento à morte do filho. Relata que, ao encontrá-lo morto no chão, com os miolos para fora, os reintroduz na cabeça. Mais tarde, relata que come fezes com açúcar. O analista desloca o fato de reintroduzir as fezes no corpo para o de reintroduzir os miolos do filho morto no corpo. Comer fezes como uma forma que esse homem encontrou de lidar com a angústia em relação à morte do filho. Um tratamento ao luto, que ele oferece também à esposa. Ele procura a legitimação, através da esposa, de que fezes são iguais a miolos. Fezes como um S1 que não desloca para S2. Aparentemente este paciente, psicótico, não pôde elaborar esta metáfora. Somente no aprés-coup se poderá verificar o efeito dessa única conversa.

O que é efeito terapêutico em análise?
A psicanálise não considera o bom para todos, nem a divisão bem e mal. Isso é próprio de muitas psicoterapias, que se preocupam em predicar o efeito terapêutico. Fazer o que o Outro quer é o bem. Lacan, ao se interrogar como cada um se vira com o real, fala de um ponto triplo, Y, em que a uma divisão do bem e do mal, ele opõe uma outra divisão a partir do bem, entre o neutro e o mal. Ele subverte o sentido, muda a orientação da escolha entre o bem e o mal. Este ponto triplo é o real (Malengreau). Tratar o gozo, não pelo sentido, pela voz do bem, mas pela responsabilização do próprio sujeito. Ao mal (gozo) o analista diz não. Frente ao bem ele se mantém neutro. A neutralidade do analista é justamente esta subversão do sentido, a saber, esta espécie de aspiração, não em direção ao real, mas pelo real. O analista deve tomar distância do desejo de curar, para que o efeito terapêutico não desminta o real em jogo na experiência analítica. Os efeitos terapêuticos fazem parte da análise. Quem se manteria nela se não os experimentasse?

Quem diz que houve efeito terapêutico é o sujeito. Não se tem em psicanálise uma definição de efeito terapêutico válida para todos, assim é preciso verificar o que seja terapêutico em cada caso, o que implica na singularidade de cada sujeito. Verificar se o sujeito não se fecha em uma nova identificação. O que importa não é tanto a modificação do sintoma, mas a implicação do sujeito. Isto marca diferença com as psicoterapias que se colocam no lugar de predicar o efeito terapêutico.

“Deixar-se aspirar pelo real quer dizer se deixar aspirar por estes efeitos terapêuticos mesmo que eles atirem o sujeito para além de si mesmo, ao risco de se tornarem um dia obsoletos. Seu destino é imprevisível. Consentir nisso faz parte dos efeitos terapêuticos.” (Malengreau, p. 63)

Se o efeito terapêutico é objeto da demanda do sujeito, o efeito terapêutico rápido é objeto da demanda do sujeito da civilização do instantâneo, diz Miguel Bassols, em que o tempo para compreender dá lugar ao imediato do gozo.

Urgências subjetivas
Tema também da atualidade, relacionado aos efeitos terapêuticos rápidos, é o das urgências subjetivas. Estas apresentam o paradoxo de que, ao mesmo tempo em que demandam um efeito rápido, travam batalha com a demanda de satisfação imediata.

Terapias breves
As terapias breves são focais, sendo o conflito focal determinado pelo motivo da consulta. Faz parte da técnica o terapeuta exercer papel ativo, motivar e demonstrar compreensão da problemática do paciente, assumindo, muitas vezes, uma tarefa pedagógica. Tem duração limitada ou objetivo limitado. Compara o resultado visado com o resultado efetivo. Malan e Balint insistem sobre a necessidade da interpretação clássica da transferência em referência ao Édipo e ao passado. (La Sagna)

Diferentemente, os efeitos terapêuticos rápidos em psicanálise, obtidos do encontro com a causa não se confundem com terapia breve, mas sim, nos fornecem a estrutura mínima da experiência deste encontro. Não se trata de procurar o analista para encontrar a causa e dela se curar, pois, deste encontro, não se cessa de não curar. Tal é o efeito que a psicanálise deve saber produzir hoje, face à invasão das falsas promessas terapêuticas. (Bassols)

Os efeitos rápidos em psicanálise
Para Freud o efeito terapêutico não estaria diretamente ligado à causa (inconsciente), ele é obtido por acréscimo, um efeito colateral em relação ao trabalho analítico, em sua batalha com a satisfação pulsional. O efeito terapêutico como objeto da demanda do sujeito é o efeito terapêutico rápido e difere do efeito terapêutico que decorre de um encontro com a causa, já que este encontro não necessita, não reclama efeito terapêutico, efeito que vem sempre por acréscimo.

Talvez não seja pertinente à psicanálise dizer de seus efeitos terapêuticos. Os efeitos da psicanálise são sempre psicanalíticos. Terapêutico é um termo da medicina e implica em juízo de valor, na bipartição saúde/doença, bem/mal, certo/errado. Seria tomar o real pelo ideal. Seria, tomando Weber, ficar na ética de princípio. A psicanálise não visa predicar o bem e o mal, que implicaria na morte da humanidade. Forbes remete seus ouvintes ao Génesis, onde havia a árvore do bem e a do mal. Sabemos a que isso levou.

A clínica do significante, cujo final de análise é baseado na travessia do fantasma, exige muito tempo de análise. Envolve explicação e um cálculo lógico. A clínica do real, Forbes insiste, não exige tempo longo, ela tem efeitos rápidos, porque ela é baseada no ato analítico. A felicidade, um motivo possível de final de análise na segunda clínica, envolve afirmação pelo sujeito. O tempo não pára, como diz Cazuza. Prevalece a ética da conseqüência.

Referências Bibliográficas
Bassols, M. - Rencontrer la cause, La Cause freudienne, nº 61, nov. 2005, Navarin Éd.
Cazuza e Brandão, A. – O tempo não pára.
Forbes, J. - Projeto Análise – Módulo II, 2005.
Forbes, J. - Apresentação de Paciente, 18 de novembro de 2005, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
Freud, S. (1983) - Casos Clínicos – Katharina, Obras Completas, vol. II, p. 173, Rio: Imago, 1974.
Gil, G. e Fonseca, C. – O eterno Deus mudança.
Malengreau, P. - Le Neutre et le thérapeutique, La Cause freudienne, nº 61, nov. 2005, Navarin Éd.
Miller, J.-A. e outros - Efectos terapêuticos rápidos – Conversaciones Clínicas con Jacques-Alain Miller en Barcelona, Paidós, 2005.
La Sagna, P. – Thérapies brèves ou thérapies “autofocus”, Lettre Mensuelle, nº 236, 2005.

TEXTO ORIGINALMENTE BUBLICADO EM http://www.jorgeforbes.com.br/